SALMO 4
1 Ao Mestre do Coro. Para instrumentos de corda. De Davi
2 Quando grito por ti, responde-me, Deus, minha justiça,
livra-me da angústia, tem piedade, escuta a minha prece!
3 “Até quando, filhos do homem, manchareis a minha glória,
adorando nulidades e procurando a ilusão?”
selah
4 Sabei que Javé realiza prodígios para o seu fiel,
pois Javé escuta, quando grito por Ele.
5 Tremei e não pecai;
Ef 4,26
já deitados, examinai vossa consciência,
e descansai tranqüilos.
selah
6 Sacrificai o que é justo oferecer,
Sl 51,21
cheios de confiança em Javé.
7 Muitos dizem: “Quem nos mostrará a felicidade?”
Brilhe sobre nós, Javé, a luz do teu rosto!
Nm 6,25
8 Puseste em meu coração mais alegria
do que nos dias de pão e de vinho fartos.
9 Em paz me deito, e logo me adormeço.
Sl 3,6
Só tu, Javé, me fazes repousar confiante.
SALMO 4
Este Salmo é uma deliciosa melodia noturna do Saltério (um noturno sálmico). O orante é um testemunho privilegiado do amor de Deus e sua mensagem confiante passa intacta, mesmo através do frio e da obscuridade da noite. O comentário ideal, possivelmente, é o da prece vespertina da liturgia da sinagoga: “É um dom de tua santa vontade, ó Senhor, que eu possa deitar-me em paz e acordar assim também. Faz com que meu sono não seja aterrorizado por pesadelos ou visões impuras. Faz com que o meu repouso seja o da inocência…”
Uma introdução estereotipada (v. 2) procura provocar a escuta de Deus. O original hebraico é sugestivo quando descreve “a libertação da angústia”: o que supõem uma imagem familiar aos nômades do deserto: espaços abertos, opostos ao círculo constrangedor da angústia. Deus escancara diante do seu fiel os horizontes luminosos e ilimitados. Por isto, a mensagem central do Salmo (vv. 3-7) contém um vigoroso apelo à confiança em Deus, vencendo todas as tentações de fuga. Existe, de fato, o risco de sermos embriagados pelo “nada” e pelas “ilusões”, dois termos que, no Antigo Testamento, indicam o ídolo, a figura dos objetos adorados, a morte oculta nos deuses vãos e ilusórios.
Existe ainda o risco da consciência obscurecida pelo mal. Por isto, nos difíceis versículos de 5 a 7 o poeta convida os seus interlocutores a “examinar a consciência” no segredo da noite, quando se está na calma e no silêncio. Só assim nasce a verdadeira religiosidade, tecida de fé autêntica e de um culto segundo a justiça (v. 7).
Fica no ar, então, esta pergunta: “Quem nos mostrará a felicidade?”. O fiel quer dar uma resposta a esta perene pergunta que brota da humanidade: só a luz da face de Deus é fonte de nossa alegria.
É assim que a lírica se fecha com um pequeno quadro, quase auto-biográfico, de grande paz, figurado através da simbologia clássica agrícola do trigo e do vinho (v. 8), os produtos nacionais, com a azeitona, da terra de Israel. No centro da cena vemos o justo, adormecido em paz. Sua vida, serena e feliz, está nas mãos de Deus.
O poeta cristão, Paul Claudel, parafraseando este Salmo, escrevia: “Está em mim esta paz que vai de encontro ao sono. Está em mim um tesouro de esperança que tu me deste.”