Introdução ao Espírito da Liturgia
Joseph Ratzinger (Bento XVI) – Loyola / SP, 4a ed 2015
Quando este livro foi escrito e publicado no original, Ratzinger não era Papa, mas Cardeal e teólogo acreditado. Homem do Concílio, quem abrir suas páginas vai encontrar o espírito e a letra do grande acontecimento da Igreja no século passado e um debate, nada polêmico, mas sempre esclarecedor, sobre ideias que surgiram a respeito da prática litúrgica da Igreja, e que atingiam, muitas vezes, seu próprio “ser Igreja”. Depois de uma breve “Premissa” para dar a conhecer o foco do trabalho, seguem-se as quatro partes: I “Sobre a essência da Liturgia”; “Liturgia e Vida: o lugar da liturgia na realidade”; “Liturgia, Cosmos, História”; “Do Antigo ao Novo Testamento – a forma basilar da liturgia cristã determinada pela fé bíblica”; II “Tempo e lugar na Liturgia”: “Observações preliminares sobre a relação da liturgia com o espaço e o tempo” (lugares litúrgicos, calendário litúrgico, etc.); “Lugares Santos: o significado do edifício igreja”; “O altar e a orientação da oração na liturgia”; “A custódia do Santíssimo Sacramento”; “Tempo Santo”; III “Arte e Liturgia”: “A questão das imagens; “Música e liturgia”; IV “Forma litúrgica”: “O rito”; “O corpo e a liturgia”. Sendo obra de um Professor, o livro trás Bibliografia )geral e particular”. Na “Premissa, Ratzinger presta homenagem à obra basilar de Romano Guardini, “O Espírito da Liturgia”, publicada em 1918, no final da primeira grande guerra, e que teve a força de desencadear o movimento litúrgico, que foi determinante no tempo do Concílio Vaticano II. Algumas linhas do final, podem ajudar a recomendar ou não a leitura deste livro: “Se olharmos, pois, os outros três elementos dos sacramentos (além da água) – óleo de oliva, pão de trigo e vinho – salta aos olhos uma diferença característica com relação ao dom da água. Enquanto a água é um elemento vital, comum para a terra inteira, e adequada apra ser em todos os lugares a porta da entrada no comunhão com Cristo, no caso dos três outros elementos estamos diante de dons típicos da área mediterrânea. De forma explícita, encontramos este trio no grandioso Salmo da criação (104), no qual o orante agradece a Deus pelo fato de dar alimento ao ser humano: “o vinho, que alegra o coração do homem; o óleo, que faz brilhar a sua face; o pão, que nutre suas forças” (vv. 14ss). Estes três elementos da vida mediterrânea são expressão da bondade da criação, nos quais recebemos a bondade do Criador. Ora, eles se tornam dom de uma bondade ainda maior: uma bondade que faz resplandecer de nova maneira a nossa face, na semelhança com “o Ungido” de Deus, o seu dileto Filho Jesus Cristo, uma bondade que transforma o pão e o vinho da terra em Corpo e Sangue do Redentor, de modo que nós, por meio do Filho, que se fez homem, nos comunicamos com o próprio Deus, Uno e Trino. Sobre este ponto se objeta, hoje, que propriamente estes dons possuem força simbólica apenas no âmbito mediterrâneo. Em outros contextos culturais, eles deveriam ser adaptados com elementos correspondentes. É a mesma questão que já encontramos, quando tratamos da reviravolta dos símbolos cósmicos no hemisfério Sul. Mais uma vez se constata que, no concurso entre cultura e história, a precedência cabe à história. Nela, Deus agiu diretamente e, por meio dela, Ele conferiu aos dons da terra seu significado. Os elementos se tornam sacramentos, graças à sua ligação com a história única e irrepetível de Deus com os homens em Jesus Cristo. Repetimos mais uma vez: a Encarnação não significa arbítrio, mas exatamente o contrário: ela nos liga à história – exteriormente casual – ocorrida então. Esta é a forma da história desejada por Deus e para nós o sinal confiável que Ele quis imprimir na terra, a garantia de que não queremos inventar alguma coisa para nós mesmos, mas que, realmente, somos tocados por Ele e chegamos a encontrá-lo…”