Hino ao Santíssimo Sacramento
“Com devoção Te adoro”
Algumas reflexões extraídas de “Isto é o Meu Corpo – à luz de dois hinos eucarísticos” de Raniero Cantalamessa, Loyola / SP
1. Ação de graças, bênção, são estes os sentidos que se encontram na palavra judaica “beraká”, traduzida em grego por “eucaristia”. A linguagem mais próxima a ela é, portanto, a do salmo de louvor, ou seja, da poesia e da música, pois são adequadas para traduzir não só conceitos, mas também sentimentos e impulsos do coração.
2. Palavra e Espírito na Consagração:
“A vista, o tato e o gosto não Te alcançam,
Mas só com o ouvir-te, firmemente, creio.
Creio em tudo o que disse o Filho de Deus,
Nada mais verdadeiro do que essa Palavra da Verdade”.
Um cântico de louvor de Jacopone de Todi, composto em torno de 1300, contém uma clara alusão a esta estrofe do hino “Com devoção Te adoro”. Nele, Jacopone imagina uma espécie de polêmica entre os vários sentidos humanos com relação à Eucaristia. Três deles afirma que é somente pão, mas o ouvido se levanta e os faz recuar, assegurando que “sob estas aparências visíveis está escondido o Cristo”.
Se isto não basta para confirmar que este hino é de Santo Tomás de Aquino, mostra, pelo menos que ele é mais antigo do que se acreditava e remonta aos últimos anos de vida do Doutor Angélico [Sto. Tomás]. Se Jacopone alude a ele como texto conhecido, então deve ter sido composto algumas décadas antes e gozar de notável popularidade.
A bem da verdade, os sentidos de visão, tato e olfato não se enganam, mas somos nós que podemos nos enganar interpretando o que nos dizem. Eles não se enganam porque o objeto próprio dos sentidos são as aparências: aquilo que se vê, se toca e se saboreia, e as aparências são realmente do pão e do vinho. Santo Tomás escreve: Neste sacramento não existe nenhum engano. Os acidentes, com efeito, percebidos pelos sentidos realmente existem, enquanto o intelecto, que tem por objeto as circunstâncias das coisas, é preservado de cair no engano pela fé”.
[“Com devoção Te adoro, oculta Divindade,
Em verdade escondida sob estas figuras.
A ti meu coração todo se confia,
Porque ao contemplar-Te cai e desfalece”.
A vista, o gosto e o tato em Ti já nada alcançam,
Mas só de ouvido eu creio e tenho Fé,
Pois creio no que disse o Filho do Deus Vivo,
E nada há mais verdadeiro que a Palavra da Verdade”.]
(…)
É evidente de que palavra se trata: da palavra da instituição que o sacerdote repete na Missa: “Isto é o Meu Corpo“ (“Hoc est Corpus Meum”), “Este é o Cálice do Meu Sangue” (“Hic est Calix Sanguinis Mei”).
A esta exata palavra se refere o Autor do Hino “Canta ó língua” (“Pange língua”), quando escreve que “com uma palavra que “o Verbo feito carne, com uma palavra muda o pão em Sua carne”. Uma passagem da “Suma Teológica”, que Santo Tomás no nosso hino parece ter transformado em poesia, diz:
“Que o verdadeiro Corpo e Sangue de Cristo está presente no Sacramento, é algo que não pode ser percebido nem com os sentidos, nem com o intelecto, mas somente com a Fé, a qual se apoia na autoridade de Deus, Por isso, comentando a passagem de Lucas 22,19, Cirilo afirma: ‘Não duvide que isto seja verdade, mas aceita com fé as palavras do Salvador, porque Ele, sendo a Verdade, não mente’ ”…